Morador do Recanto das Emas, o jovem é acompanhado pelo Creas Diversidade, na 615 da Asa Sul. “Eu cheguei aqui há alguns meses orientado por um médico. Foi para ele que contei minha história pela primeira vez. Daí ele me sugeriu conversar com minha família e procurar o Creas, onde fui atendido integralmente”, conta G.F.O.S, que jamais sentiu-se feliz sendo menina.
Aos 15 anos, ele falou com a mãe, que o apoiou imediatamente. “Minha infância e pré-adolescência foram muito difíceis, pois eu não me entendia e não me aceitava”, lembra. “Na puberdade, eu estava me transformando em uma mulher. Até tentei me relacionar com um garoto, mas foi a pior experiência da minha vida, pois aquela não era minha orientação sexual. Então decidi ser feliz”, completa.
“É uma luta por dignidade e reconhecimento formal para pessoas que precisam enfrentar desafios diários simplesmente para serem vistos como são de fato”Ana Paula Marra, secretária de Desenvolvimento Social
Em 23 de outubro passado, ele completou 18 anos. No dia seguinte, a equipe do Creas Diversidade estava com toda a documentação pronta para ser levada ao cartório com o intuito de iniciar o processo de retificação de nome e gênero. Na última segunda-feira (31), chegou a nova certidão de nascimento com as tão sonhadas alterações.
“Parecia o início de uma nova vida. Eu me senti renascido. Agora, da maneira como me reconheço e me sinto”, descreve o estudante do 3º ano do ensino médio, que pretende fazer a mastectomia (cirurgia para retirada das mamas), tornar-se policial federal e fazer um viagem estilo mochilão pela Europa.
Além de intermediar o processo para retificação de nome e gênero, a equipe multiprofissional do Creas Diversidade prestou atendimento integral ao jovem. Na unidade, ele foi encaminhado para o Ambulatório Trans, onde faz tratamento hormonal; entrou no Cadastro Único, foi inscrito para pleitear o Programa Prato Cheio e teve deferida a concessão do Auxílio Vulnerabilidade mensal de até seis parcelas de R$ 408 para ajudar na compra dos remédios que chegam a custar R$ 500 a dose, pois a mãe de 42 anos está desempregada atualmente.
“Mensalmente, ele vem aqui, pois o acompanhamento precisa ser sistêmico. Não apenas dele, mas da família”, explica a psicóloga do Creas Diversidade, Karla Sindeaux. “A história do G.F.O.S é um relato de força e superação. Ele estava muito seguro de sua decisão e de seus objetivos. Então, corremos contra o tempo, para estar com tudo pronto assim que ele atingisse a maioridade”, complementa a agente social responsável pela articulação com a defensora pública do DF, Débora Lorena Almeida.
“Hoje, vejo meu filho feliz”, emociona-se a mãe, G.S**. “Quando veio a primeira menstruação, ele caiu em depressão”, relembra. De acordo com ela, o tema era um tabu na família, tanto que o jovem voltou a falar com o pai há pouco tempo devido ao preconceito, exatamente como na música citada no início deste texto. “Foram pescar juntos esses dias. Foi algo muito importante para eles”, finaliza.
Retificação de nome e gênero
O Creas Diversidade não faz o procedimento. Porém, por meio de uma parceria, desde 2014 articula tudo com o Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Distrito Federal, com base no Provimento nº 73/2018 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ocorrem, em média, 20 atendimentos desse tipo todos os meses na unidade.
“É uma luta por dignidade e reconhecimento formal para pessoas que precisam enfrentar desafios diários simplesmente para serem vistos como são de fato”, destaca a secretária de Desenvolvimento Social, Ana Paula Marra.
Quem busca pela retificação de nome e gênero basta procurar o Creas Diversidade, seja diretamente na unidade ou por telefone ou e-mail – centrodadiversidade@sedes.df.gov.br ou creasdiversidade@gmail.com; 3773-7498 e 3773-7499. Os documentos necessários para retificação são RG, CPF, certidão de nascimento e título de eleitor.
*Com informações da Secretaria de Desenvolvimento Social do DF
**Os nomes das personagens foram abreviados para preservar o sigilo de suas identidades